A desalmada.

Muitas pessoas não sabem que além de projeto de empresária no ramo publicitário, blogueira, piadista incondicional e desastre natural, eu também trabalho na televisão, como voluntária.
Além desse meu dom (sobre)natural pra comunicação (escrita, falada, gesticulada), eu também sou cinéfila. Calhou d'eu cair na equipe de um dos programas do NET Cidade, justamente sobre cinema, como roteirista.
Gurizada, adoro. Descubro várias coisas sobre filmes, atores, produção, e de quebra, extravaso essa perua literária que existe dentro do meu peito reprimido. Saio do armário desmunhecando a roteirista louca que vive nessa cabeça emoldurada com cabelos loiros.
Ontem, teve reunião com a galera do programa. Eu não tava muito boazinha, queria ficar em casa, embaixo de um edredon velho comendo um pote de sorvete de chocolate com calda de chocolate e pedacinhos de bolacha de chocolate (Sim, eu tenho TPM).
Mas era coisa importante. Reunião de começo de ano, possível reformulação dos quadros, novas pessoas. - Vaiiii, Celise, vai ser legalllll! Você tem que irrrr! - Ok, consciência, eu vou...
Dei um trato na juba, fiz uma maquiagem disfarça-humor-negro, botei uma ropitha alegre, e lá fui eu pro canal.
- Mãeeee, tô indo...
- Tchau, fia. Vai cum Deus. E vê se fica mais alegrinha...
- Tá. Cadê o rádio do carro?
- Vixe, tirei e guardei láááá no fundo daquela gaveta, do armário do meu quarto. Ou pode ter sido na cozinha. Ou será que foi lá na sala de visita, na copa?
- Ok, mãe. Deixa o rádio pra lá.

Todo mundo já viu a cena da mocinha com TPM dirigindo. Quando tem rádio, ela canta berrando junto com a música, as vezes chorando. Se for música sertaneja, então, ela começa a dialogar as mazelas da vida junto com o cantor. Sem rádio, ah, rapaz. A mente vira a oficina do diabo.
Faltava uns 4 quarteirões pra chegar no canal, vejo um amigo voluntário, do lado de sua moto. Ele parece discutir exaltado com uma loirinha. Gesticula, coloca a mão na cabeça. Olha desconsolado para o chão.
Eu, muito besta, fico feliz por ver um rosto amigo. Aceno VI-GORO-SA-MENNNTE com o coração cheio de alegria, quando o diabo que habitava a minha mente diz:
- Mai tu é uma loira burra, mermo, né Celise?
- Porquê? Ele é meu amigo, eu gosto dele!
- Não tá vendo que tá rolando a maior DR (Discussão de Relacionamento)? Não pára esse carro que tu vai levar porrada da loira brava. VAI VAI VAIIIII.
Continuei o caminho, olhei no retrovisor, e o garoto me olhava com aquela cara de fuzileiro naval



Como a dama que sou, pensei polidamente: FODEU.
Poutz, se o cara tava ouvindo umas abobrinha da namorada, agora que eu dei esse sorrisão gratuito, e esse tchauzinho de piranha do carro, ele vai perder mais meia hora aí...
Dito e feito.
A reunião começou e nada do dito cujo chegar.
20 minutos... Tal quadro foi cortado, estamos acrescentando isso, mas tudo depende do trabalho dos editores-voluntários, aliás, cadê o Patrik?
Quietinha, Celise. Não conta que foi você que fez o cara atrasar.
Meia hora... 40 minutos. A reunião tava acabando... Entra o rapaz. Capacete na mão e cara de RAROS amigos. Não respondia direito nenhuma pergunta, me olhava de lado.
Acabou a reunião, lá vem ele na minha direção:

- VOCÊ, HEIN CELISE?
- Poxa, Patrik, desculpa... Eu não achei qu...
- PASSOU POR MIM, VIU A MINHA MOTO QUEBRADA, MINHA IRMÃ ATORMENTANDO A MINHA VIDA, DEU UM TCHAUZINHO E NEM PAROU PRA ME DAR UMA CARONA? MUI AMIGA, VOCÊ! TAVA SOZINHA NO CARRO, O QUE CUSTAVA PARAR?


Nem preciso dizer que rolou entreterimento pra galera por mais 40 minutos depois dessa.

Moral da história: Nem sempre o: EU VI COM MEUS PRÓPRIOS OLHOS é uma prova cabal. Em tempos de TPM, tem que ouvir com os próprios ouvidos, e tatear com o próprio tato.